O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) derrubou a medida que impedia a demolição de imóveis construídos ilegalmente na Praia de Naufragados, Florianópolis. Atendendo ao pedido do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), a decisão reforça a retirada de construções em área de preservação permanente, conforme sentenças de 2004 que já transitaram em julgado, ou seja, não são passíveis de recurso.
O MPSC argumentou que a região de Naufragados não possui uma comunidade tradicional ou ocupação coletiva, posição corroborada por relatórios da FATMA desde 1984 e análises recentes do IPUF. Além disso, o Supremo Tribunal Federal (STF), em decisão do Ministro Alexandre de Moraes, declarou que a proteção de povos tradicionais não é aplicável ao caso.
A Praia de Naufragados está localizada dentro do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro e é uma área de preservação permanente de restinga, protegida pelo Código Florestal. Essas áreas não permitem construções, e a legislação não permite regularização fundiária dos imóveis clandestinos.
O município de Florianópolis havia obtido uma suspensão das demolições com base na Lei 8437/92, mas o MPSC recorreu com sucesso, destacando que a maioria dos processos já tem decisões definitivas de mérito, impossíveis de revisão. A lei citada pelo município não se aplica a processos já transitados em julgado.
Com a derrubada da medida suspensiva, as ordens judiciais para desocupar e demolir as construções ilegais serão executadas. Isso inclui a remoção dos entulhos e materiais dos imóveis em questão, garantindo a preservação do meio ambiente na área.
Naufragados não possui infraestrutura pública, e as construções ilegais causam danos ambientais significativos. A ocupação da área é clandestina e começou nos anos 1980, sem qualquer autorização do poder público.
ENTENDA MELHOR O CASO
Diferença entre Naufragados e Jurerê
A atuação do MPSC em Naufragados se dá porque a área é de preservação permanente, sob jurisdição estadual, enquanto os beach clubs de Jurerê estão em faixa de marinha, área federal, onde a atuação cabe ao Ministério Público Federal. Além disso, Jurerê é uma zona urbana consolidada, diferentemente de Naufragados, que não está no perímetro urbano e carece de serviços públicos.
Essas medidas são essenciais para a conservação ambiental e a aplicação da lei, garantindo que áreas protegidas permaneçam preservadas e livres de ocupações ilegais.
Existe comunidade tradicional em Naufragados?
Não. Quando foi criado o Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, do qual significativas porções da região de Naufragados ainda fazem parte, não havia qualquer residência na área – apenas três a cinco ranchos de madeira de ocupação temporária, como atestado pelo Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (IPUF) na época.
A ocupação da área se iniciou de forma clandestina nos anos 1980. Somente em 1984 foram identificadas poucas construções em Naufragados – todas ilegais e fruto de invasão de área de preservação permanente. Eram de 12 a 15 casas, sendo somente quatro de moradia fixa, conforme relatório da Fundação do Meio Ambiente (FATMA).
A atividade pesqueira desenvolvida em Naufragados nunca utilizou residências permanentes, mas apenas instalações temporárias para o período da pesca.
Por que os imóveis são ilegais?
As casas foram construídas de forma clandestina, sem qualquer autorização do poder público (licença ambiental, alvará de construção etc.), em área de preservação permanente (APP) de restinga, local onde não é permitida a realização de edificações, tanto pela legislação federal (Código Florestal), quanto pelo atual Plano Diretor de Florianópolis.
Inicialmente, a Praia de Naufragados fazia parte da área do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro. Em 2009, por meio de uma alteração da legislação estadual, o local foi transformado na unidade de conservação estadual denominada “Área de Proteção Ambiental do Entorno Costeiro”, mas isso não alterou a situação de ilegalidade das construções, pois as restrições estão mantidas tanto pela legislação federal como pela legislação municipal.
Os ocupantes atuais não ajudam a preservar a área?
De forma alguma. A simples inspeção visual já permite verificar que a construção de casas ilegais demandou o desmatamento de áreas de preservação permanente significativas, causando danos à flora e fauna locais. Além disso, não há qualquer sistema de esgotamento sanitário para a destinação dos efluentes de eventuais ocupantes dos imóveis, tampouco serviço de coleta de lixo.
Não é à toa que um parecer do Instituto de planejamento Urbano de Florianópolis (IPUF) de 2015 conclui que a ocupação da área compromete a preservação do meio ambiente, devendo-se restringir seu uso aos pescadores artesanais (com utilização controlada de estruturas de apoio temporárias e restritas ao período de pesca) e banhistas e usuários com intuito de lazer.
Existe alternativa para a demolição dos imóveis ilegais em Naufragados?
Não. Todas as edificações estão situadas em uma área de preservação permanente de restinga, protegida pelo Código Florestal brasileiro, por ser um ecossistema muito frágil e extremamente relevante para a preservação da fauna e da flora locais, onde não são admitidas edificações. Dessa forma, a própria legislação não permite a regularização fundiária dos imóveis clandestinos da área.
Por que o MPSC pode agir em Naufragados, mas não atua em casos como o dos beach clubs em Jurerê, por exemplo?
Os beach clubs de Jurerê estão na faixa de marinha, ou seja, distantes menos de 33 metros da areia da praia, portanto pertencem ao domínio da União (art. 20, inciso VII, da Constituição Federal). Assim, somente o Ministério Público Federal tem atribuição de atuação nesse caso.
Já Naufragados é uma região classificada como área de preservação permanente (APP) pela legislação federal e pela legislação municipal e é parte de duas unidades estaduais de conservação da natureza: o Parque Estadual da Serra do Tabuleiro e a Área de Proteção Ambiental do Entorno Costeiro (que abrange parte de Naufragados). Nesse caso, a atribuição é do Ministério Público estadual.
Vale ressaltar que Jurerê é uma zona urbana consolidada, ou seja, um bairro densamente habitado, integrante do perímetro urbano da cidade. Já Naufragados não está no perímetro urbano do município de Florianópolis e é desprovido de qualquer tipo de serviço público (coleta de lixo, energia elétrica, estradas, rede de água e esgoto, transporte público). Todos aqueles que edificaram em Naufragados o fizeram de forma clandestina e invadiram os terrenos que ocupam. Nenhuma licença ou ato de autoridade administrativa legitima as ocupações lá existentes. Tudo é clandestino e nenhum centavo de tributo é recolhido.
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