A Justiça Federal determinou a instituição de uma câmara de conciliação para tratar da questão do Quilombo Vidal Martins, na localidade do Rio Vermelho, que é objeto de dois processos em curso na 6ª Vara Federal de Florianópolis (Ambiental). O despacho que prevê a criação do grupo foi assinado ontem (11/5) pelo juiz Marcelo Krás Borges, ao final de uma audiência que reuniu as partes envolvidas.
De acordo com o despacho, os integrantes da câmara serão escolhidos pelas partes e terão poderes para apresentar uma proposta de solução conjunta da questão, com subsídios e sugestões sobre um possível zoneamento do território quilombola. O Ministério Público Federal (MPF) deverá apresentar um relatório sobre a situação as necessidades atuais de comunidade quilombola.
Os processos foram suspensos até o dia 18 de agosto, quando acontecerá outra audiência, para que as partes informem quem serão os integrantes e quais são as suas sugestões. Ainda segundo o termo de audiência, a Fundação Cultural Palmares foi admitida no processo como amicus curie [amigo do tribunal], para auxílio teórico e técnico.
Participaram da audiência, além do MPF e da Fundação Palmares, representantes da Associação dos Remanescentes do Quilombo Vidal Martins (ARQVIMA), da União, por meio do Ministério da Igualdade Racial, da Defensoria Pública da União (DPU), do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), do Estado de Santa Catarina e do Instituto do Meio Ambiente (IMA).
Um dos processos é uma ação civil pública do MPF contra o Incra, para finalização dos procedimentos para reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras reivindicadas pela comunidade remanescente do quilombo. O outro é uma ação de reintegração de posse do IMA contra a ARQVIMA.
Entenda o caso
A Justiça Federal, em dezembro de 2022, realizou inspeção judicial no Quilombo Vidal Martins, em Florianópolis, com participação do Ministério Público Federal (MPF), Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Defensoria Publica da União, Instituto do Meio Ambiente (IMA) e Procuradoria do Estado.
O objetivo foi averiguar as condições de vida dos quilombolas, principalmente os ocupantes da sede do camping do Parque Estadual do Rio Vermelho. O parque se sobrepõe a área do quilombo, reconhecida pelo Incra como de tradicional ocupação de descendentes de escravos, em julho deste ano. Moradores ocuparam a sede do parque após ela ficar fechada por mais de um ano.
Os quilombolas reivindicam com urgência autorização para construir casas e administrar o camping no local. O parque estadual é administrado pelo IMA, está sob litígio judicial, mas abriga dois campings privados.
A procuradora da República Analucia Hartmann propôs a criação de uma comissão ou fórum, envolvendo a comunidade, a União, o governo estadual, o Instituto do Meio Ambiente, o Incra e o próprio MPF. “Será preciso discutir como utilizar o camping no verão como fonte de renda e disponibilizar verbas públicas para reforma da sede do parque. Vamos reconhecer que eles têm direito a esta área e harmonizar os interesses da comunidade com a preservação do meio ambiente”.
Quando há sobreposição de competências como no caso do Quilombo, reconhecido legalmente pela União, e uma unidade de conservação, a lei determina que sejam criadas câmaras de conciliação.
Quilombo reconhecido – O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) publicou em julho de 2022, no Diário Oficial da União (DOU), a portaria nº 1511, que reconhece e declara como terras da Comunidade Quilombola Vidal Martins área de 961,28 hectares, localizada no Bairro Rio Vermelho, no Município de Florianópolis (SC). Com a publicação de reconhecimento, restam ainda as fases de delimitação e demarcação física da área e, por fim, a titulação das terras. O Quilombo Vidal Martins é constituído de 28 famílias descendentes de escravos e completou 180 anos em 2011. Porém, apenas em 2013 foi expedida, pela Fundação Cultural Palmares, a certidão de autorreconhecimento quilombola, pré-requisito do processo de reconhecimento.