Um dos principais problemas da atualidade é a dificuldade em lidar com a imensa quantidade de informações. Conseguir identificar o que realmente importa em meio ao turbilhão de dados a que temos acesso diariamente é um desafio não apenas para o cidadão comum, mas também para os órgãos de fiscalização, como é o caso do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC). Pelos próximos cinco anos, uma equipe de professores da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) vai pesquisar meios de enfrentar esse problema usando Inteligência Artificial (IA) e Estatística. Esses métodos permitem descobrir padrões escondidos em grandes volumes de dados, o que pode ser um caminho para o combate à corrupção.
O Projeto Céos – Inteligência de Dados para a Sociedade, vinculado ao Departamento de Informática e Estatística (INE/UFSC), teve início em março deste ano, após a assinatura de um convênio com o MPSC. Além de auxiliar o órgão na fiscalização de fraudes, o projeto também irá atuar na gestão de saúde pública. São três linhas de investigação: detecção de fraudes e irregularidades em compras e contratações públicas; detecção de padrões de ocupação de leitos de Unidade de Terapia Intensiva no Estado que permitam mitigar o problema da falta de leitos; e extração automatizada de informações de documentos, judiciais e não-judiciais, do ministério.
“O projeto busca gerar conhecimento em termos de métodos, processos e ferramentas que permitam a tomada de decisão inteligente, isto é, baseada em grandes volumes de dados usando IA e Estatística, de forma a ampliar o bem-estar social”, explica Jônata Tyska Carvalho, professor do INE e coordenador do Céos. Na entrevista a seguir, o pesquisador fala mais sobre o projeto, que conta com um investimento inicial de mais de R$ 6 milhões.
O que significa Céos e por que escolheram esse nome?
Céos, na mitologia Grega, é o titã da inteligência e, por isso, o projeto foi batizado com esse nome. É comum em projetos de pesquisa buscarmos um nome curto, ou apelido, para que possamos nos referir facilmente aos diversos projetos que desenvolvemos na universidade. Como este projeto busca analisar grandes volumes de dados usando Inteligência Artificial (IA) e Estatística, de forma a dar suporte à tomada de decisão inteligente, isto é, baseada em dados, o batizamos com este nome em alusão ao titã da inteligência.
Poderia explicar qual o principal objetivo do projeto? Ele surge como uma iniciativa da UFSC ou a partir de uma demanda do MPSC?
O projeto surge de uma demanda do próprio MPSC, que notou a necessidade de pesquisa, desenvolvimento e inovação para tornar ainda mais efetiva sua atuação nos diversos segmentos da sociedade em que atua. O projeto busca gerar conhecimento em termos de métodos, processos e ferramentas que permitam a tomada de decisão inteligente, isto é, baseada em grandes volumes de dados usando IA e Estatística, de forma a ampliar o bem-estar social. O projeto começa com três linhas de investigação: detecção de fraudes e irregularidades em compras e contratações públicas; detecção de padrões de ocupação de leitos de UTI no Estado que permitam mitigar o problema da falta de leitos; e a extração automatizada de informações de documentos, judiciais e não-judiciais, do MPSC.
O projeto é financiado pelo MPSC? Qual o valor do financiamento?
Sim, o projeto é atualmente financiado pelo MPSC, em um montante inicial de mais de R$ 6 milhões de reais para cinco anos de projeto e três linhas principais de investigação. É importante destacar que mais linhas de investigação podem ser criadas neste período, a depender do interesse e da capacidade dos envolvidos, aportando mais recursos e aumentando a duração do projeto.
Quando o projeto teve início e qual o tempo estimado de duração do projeto?
O convênio de pesquisa que formaliza o projeto foi assinado pela UFSC, Fundação de Estudos e Pesquisas Socioeconômicos (Fepese) e pelo MPSC no final de março de 2023. O projeto tem uma duração inicial de cinco anos, podendo ser prorrogado a interesse dos envolvidos e caso surjam mais linhas de investigação neste período.
Qual a importância da participação da UFSC? Quais seriam os papéis desempenhados especificamente pela UFSC e pelo MPSC no âmbito desta parceria?
Os pesquisadores e estudantes da UFSC são responsáveis por executar o projeto e conduzir a metodologia científica e de ciência de dados proposta de forma a alcançar os objetivos estabelecidos. O MPSC tem papel fundamental no projeto, pois além do grande conhecimento do domínio de aplicação, possui também a infraestrutura e a equipe de Tecnologia de Informação (TI) para hospedar, manter e evoluir as soluções que serão desenvolvidas no âmbito do projeto.
A UFSC também terá um papel formador para membros do MPSC, pois parte dos servidores envolvidos no projeto farão mestrado e/ou doutorado no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Computação (PPGCC) da UFSC.
Quais departamentos da UFSC estão envolvidos? Quantos pesquisadores participam do projeto?
Atualmente participam do projeto oito pesquisadores de diferentes áreas da Estatística e da Computação, sendo todos do quadro do Departamento de Informática e Estatística (INE). Entretanto, estamos buscando novas parcerias com mais departamentos da Universidade, outras universidades, e também com novas instituições públicas interessadas em tomada de decisão inteligente para a sociedade. Um dos objetivos de longo prazo deste grupo é se tornar uma referência e um hub que conecte múltiplas instituições públicas e privadas que busquem colaborar para transformar os grandes volumes de dados que possuem em tomada de decisão inteligente nos domínios em que atuam.
No início de junho foi realizado um workshop no MPSC para debater o combate às fraudes em licitações. Quais ações e decisões foram tomadas?
O workshop foi uma das atividades iniciais e de suma importância previstas no plano de trabalho do projeto, pois ele guia as demais ações. Em projetos de Ciência de Dados um erro comum é as equipes não terem o entendimento adequado do domínio de aplicação, e também os objetivos e critérios de sucesso da instituição em questão, MPSC, não serem definidos adequadamente. Neste sentido, essa primeira ação nos ajudou a dar os primeiros direcionamentos para as próximas fases de coleta, integração e preparação de dados de forma geral, revisões direcionadas da literatura científica, desenvolvimento de análises de IA e Estatística, entre outras ações. Essa é apenas uma das diversas interações que teremos com os promotores e técnicos do MPSC para a definição das mais adequadas direções de pesquisa e inovação a serem seguidas.
Quais as vantagens do uso da IA?
Os métodos de IA e Estatística, especialmente os métodos utilizados no contexto de Ciência de Dados, permitem descobrir padrões escondidos em grandes volumes de dados, algo impossível de se fazer manualmente ou por meio de painéis de dados (dashboards). Em uma sociedade cada vez mais digital, ter a capacidade de detectar estes padrões influencia diretamente na efetividade da instituição em questão, MPSC, em realizar o seu trabalho por meio de ferramentas que suportem a tomada de decisão inteligente, por exemplo, nos casos de combates a corrupção, predição e melhor entendimento de ocupação de leitos de UTI e muitos outros casos.
Vocês conhecem projetos semelhantes desenvolvidos em outros lugares?
Faz parte do escopo do projeto mapear iniciativas semelhantes e estabelecer parcerias com mais instituições interessadas no tema. Sabemos que o MP da Paraíba desenvolveu um case de sucesso com a Universidade Federal da Paraíba (UFPB), e também que a Universidade Federal do Ceará (UFC) teve projeto semelhante com a Secretaria da Fazenda do seu estado. Estamos mapeando todas as iniciativas no Brasil e no mundo, e na medida do possível, pretendemos entrar em contato e criar uma rede de colaboração nesta área, especialmente em se tratando de combate a corrupção.
Quais resultados esperam obter?
Esperamos gerar conhecimento científico e tecnológico que permita que as instituições públicas brasileiras possam tomar decisões inteligentes, isto é, baseadas em grandes volumes de dados, de forma a maximizar seus resultados e trazer cada vez mais bem-estar e benefícios para a sociedade catarinense e brasileira.